O
projeto de lei da ministra da Justiça Christiane Taubira que possibilita aos
casais do mesmo sexo de se casarem e adotarem foi finalmente adotado pela
Assembleia Nacional Francesa hoje à tarde.
Do
total de 566 deputados, 556 votos foram expressos. A maioria absoluta que o
projeto necessitava para ser aprovada era de 279 votos a favor, ao final, o
projeto de lei Taubira conquistou 331 votos a favor e 225 votos contrários.
|
Após a
divulgação dos resultados, os deputados comemoram aos gritos de “C’est gagné!”
|
Conforme
a análise publicada na sequência da divulgação do resultado pela Assembleia
Nacional, os principais apoiadores do projeto de lei foram os grupos Socialista
(Groupe Socialiste, républicain et
citoyen. 292 membros, 281 votos favoráveis, 4 contrários, 4 abstenções e um
membro não-votante, o presidente da casa, Claude Bartolone), Ecologista (Groupe Écologiste. 17 membros e 17 votos
favoráveis) e dos radicais-progressistas (Groupe
radical, républicain, démocrate et progressiste. 16 membros. 13 votos
favoráveis e 2 contrários). A esquerda
radical (Groupe de la gauche démocrate et
républicaine. 15 membros. 9 votos favoráveis, 4 votos contrários e 1
abstenção), por sua vez, ficou dividida. Marie-George Buffet, ex-candidata à
presidência e membro do grupo votou a favor do projeto de lei.
Os
votos contrários ao projeto de lei Taubira vieram, sobretudo, da oposição
conservadora. O partido do ex-presidente Nicolas Sarkozy, UMP, votou
massivamente contra a proposta do casamento para todos (Groupe de l’union pour un mouvement populaire. 196 membros. 6 votos
favoráveis, 183 votos contrários, 5 abstenções). Os centristas e radicais de direita (Groupe
de l’union des démocrates et indépendents. 30 membros. 5 votos
favoráveis e 25 votos contrários) e os não-inscritos (em sua maioria deputados
de extrema-direita que não obtiveram o número mínimo de cadeiras para formar um
grupo na Assembleia. 7 votos contrários, nenhum a favor) endossaram a lista
oposicionista.
O
deputado dos franceses da América Latina e Caribe, Sr. Sergio Coronado, do
grupo ecologista votou a favor do projeto de lei Taubira, recentemente, ele
havia subido à tribuna do hemiciclo para defender o casamento para todos. O
franco-brasileiro Eduardo Rihan Cypel, do grupo socialista, votou a favor. Os
antigos pretendentes à presidência francesa Jean-Louis Borloo (União dos
democratas e independentes. Centrista), Noël Mamère (Ecologistas) e
Marie-George Buffet (Esquerda democrata e republicana) votaram à favor,
enquanto que o soberanista de extrema-direita, Nicolas Dupont-Aignan
(Não-inscritos) votou contra.
Chamou
a atenção, contudo, o voto favorável ao projeto de lei dos deputados UMP, Henri
Guaino e Luc Chantel que fizeram forte oposição ao casamento para todos. Eles
declararam terem errado o botão durante a votação, ao total seriam cinco
deputados que votaram errado. Além dos dois, Alain Chrétien, Marcel Bonnot e
Marianne Dubois, todos da UMP, também erraram o botão. O erro, contudo, não mudou
o resultado de uma disputa que consumiu “136 horas e 56 minutos” de debate da
Assembleia, conforme o pronunciamento do presidente da casa, Claude Bartolone.
Ainda assim, os deputados UMP Benoist Apparu e Franck Riester que votaram a
favor do casamento para todos não se pronunciaram endossando rumores que eles
apoiaram a proposta do governo socialista.
Para os oposicionistas, a luta continua
Henri
Guaino, que foi conselheiro do ex-presidente Nicolas Sarkozy, declarou que
continuará a manifestar sua oposição ao projeto de casamento e adoção para
todos e demandará ao presidente François Hollande realizar um referendo sobre a
adoção da lei.
Os
opositores ao projeto de lei do casamento e adoção para todos que se reuniram
em torno de grandes manifestações – manifs
pour tous (manifestações para todos) prometem não baixar os braços apesar
do voto favorável da Assembleia Nacional. Uma parte dos manifestantes
contrários ainda que aceite o casamento gay se manifesta contra o projeto de
lei, pois ele permite a adoção para os casais do mesmo sexo. Para eles esse é o
grande problema do projeto, o ex-militar Philippe que participava de uma
manifestação na cidade de Tours, declarou ao jornal Le Monde: “Na verdade, o que nos incomoda na lei Taubira não é o
casamento, mas a adoção. Isso quer dizer que a criança adotada por um casal
homossexual será inscrita no registro civil como filha de dois pais homo, sem nenhuma menção aos nomes da
mãe e pai genéticos, como se fosse filha de um casal que, no entanto, não pode reproduzir.
Elimina-se uma referência fundamental na criação da identidade da criança”.
Complicações políticas
A
França foi tomada de manifestações tanto favoráveis como contrárias ao projeto
de casamento para todos, o que dominou toda a discussão política nacional desde
janeiro. Alguns líderes do manif pour
tous começam a tratar as manifestações como affaire político e se coligaram aos conservadores UMP e FN. Uma das
líderes das manifestações, Frigide Barjot apareceu recentemente ao lado de um
eleito do partido de extrema-direita FN, uma posição que não agradou à grande
parte dos manifestantes.
Após
a votação favorável na Assembleia Nacional, onde a esquerda possui uma maioria esmagadora,
a oposição irá consultar o Conselho Constitucional em relação a constitucionalidade
do projeto de lei, o que deverá retardar em mais um mês a outorga da lei por
parte do Presidente François Hollande. Os primeiros casamentos de casais do
mesmo sexo deverão ocorrer somente a partir da metade do mês de junho.
Caso
a outorga da lei se estenda e as manifestações contrárias a lei aumentem poderá
criar-se mais um problema político para o presidente François Hollande e para o
governo socialista. O grande trunfo que contam os manifestantes contrários e a
direita francesa é a pressão sobre os eleitos locais em função das eleições
municipais do próximo ano. Uma eleição que se anuncia desde já difícil à
maioria presidencial socialista em função da crise econômica na França e da
impopularidade do presidente Hollande.
A
implicação de François Hollande é direta, pois ainda candidato, o socialista
decidiu abraçar a proposta do casamento e adoção para casais do mesmo sexo,
inscrevendo-a em suas propostas de campanha:
Sob
a ótica eleitoral, para o eleitorado progressista que já havia confiado seu
voto em Hollande em maio de 2012 a adoção da lei significa o cumprimento de
mais uma proposta de campanha, contudo, é difícil identificar o quanto,
atualmente, a aprovação da lei poderá conquistar novos eleitores aos
socialistas na perspectiva das próximas eleições. O fato é que a lei representa
um grande avanço social na França. Os socialistas franceses, mais uma vez, se
colocam como os responsáveis pelas grandes mudanças societárias, da mesma forma
como nos anos 80 durante a presidência de François Mitterrand, o ministro da
justiça Robert Badinter pediu a Assembleia Nacional a abolição da pena de morte,
apoiada pela maioria socialista da Assembleia Nacional. Para aqueles que
conseguiram manter uma posição indiferente em relação à lei Taubira, sua
aprovação e futura promulgação pelo Presidente Hollande significa mudar o foco
do debate político para outros domínios, visto que o casamento para todos
ocupou a atenção dos franceses desde janeiro desse ano. Até mesmo para o
Presidente Hollande o final do grande debate sobre o casamento para todos
poderá ser uma boa notícia, pois garante seu lugar na história como chefe de
Estado responsável pela promulgação do casamento de pessoas do mesmo sexo no
14º país do mundo – 9º país europeu – e também permite que o governo volte a
apresentar para um público mais significativo suas proposições para vencer a
crise econômica internacional, recuperando o prestígio da opinião pública
francesa. Quem sabe a distância do tempo permita à François Hollande cantar seu
primeiro ano de presidente ao som de Non,
je ne regrette rien!
|
A França
deverá ser o 14º país a adotar o casamento homossexual no mundo
|
Para uma lista completa dos
deputados que votaram contra e a favor do projeto de lei, acesse o link da
Assembleia Nacional Francesa:
Oscar Augusto Berg
Brésil, le 23 avril 2013.
Fotos retiradas do motor de
pesquisa do Google.