domingo, 28 de outubro de 2012

Serra, seja Jospin!



21 de abril de 2002. O socialista francês Lionel Jospin reúne sua equipe de campanha e seus militantes para fazer seu discurso após o fracasso do PS na eleição presidencial francesa daquele ano na qual ele, pela segunda vez, representava os socialistas. Jospin não esconde seu desapontamento com os resultados, afinal ele era primeiro-ministro até então e ainda por cima bem avaliado, toma a responsabilidade pela derrota e por final, se retira da vida política francesa.

28 de outubro de 2012. O tucano José Serra reúne sua equipe de campanha e seus militantes para discursar após a terceira derrota em eleições majoritárias nesta década. Após ter sido duas vezes derrotado na corrida presidencial, Serra desta vez perde para o novato Fernando Haddad na disputa da prefeitura paulistana. Serra discursa em consonância ao seu pronunciamento de 2010 (na sequência da derrota à também novata Dilma Rousseff): não se responsabiliza pela derrota, nem a lamenta profundamente, pelo contrário. Asfixiado, disse que saíra da eleição com ainda mais energia, mas que sinceramente não sabia no que empregá-la. Engana a si mesmo, e só.

Esse texto procura ajudar Serra a encontrar um bom emprego para tanta energia: largar a toalha e abandonar a política, uma tarefa que aliás, requer tamanha energia e que já devia ter sido tomada.

Se a derrota une José Serra a Lionel Jospin, a reação face a ela, os separa. Um reage respeitando a decisão dos eleitores, afinal democrática; outro não a aceita. Retirando-se da política, este avança; Enganado-se na posição de líder, o outro afunda.

A saída de Lionel Jospin não levou automaticamente os socialistas de volta ao poder na França, levaram, ao contrário, 10 anos mais para isso acontecer. Em 10 anos, Jospin tendo saído da vida política francesa e aberto mão da liderança dos socialistas, o PS se reestruturou, adotou novas políticas e abriu espaço para novos nomes. Em 2007 não suficiente, ainda teve de engolir outra dura derrota na presidencial, mas em 2012 deu a volta por cima, e com François Hollande – um nome desligado da era Jospin – retomou o Eliseu.

A esperada (achei ‘provável’ uma palavra muito forte em se tratando de José Serra) saída de Serra também não fará do PSDB vitorioso nas próximas eleições. Muita coisa precisa ser reconstruída. Certamente ainda há Aécio Neves, mas desde FHC o PSDB não faz que queimar seus grandes nomes (Serra de outrora, Alckimin e Aécio), enquanto que sem grandes nomes o PT se fortalece. No entanto, a saída de Serra é necessária: só assim, questões obscuras como o apoio de Silas Malafaia poderá ser revisto e só assim igualmente o partido estará descansado de ter que encontrar um novo cargo para Serra após cada derrota premeditada. Até o povo tucano gostaria que Serra surpreendesse à la Jospin.

Desde 2002, quando deixou a vida política, Lionel Jospin tem se dedicado a outras tarefas: escreve, constantemente é convidado a se exprimir em cadeias de rádio e televisão nacionais, participa dos grandes congressos do PS. Recuperou o devido respeito que qualquer derrota coloca em risco. Após o desmoralizante governo Sarkozy, o novo presidente François Hollande chamou Lionel Jospin para liderar uma comissão responsável justamente por moralizar a vida política. Honra recuperada! Exemplo (apesar de eu desconhecer  José Serra escritor) a ser seguido, ex-tudo Serra!

Em 2010, Serra disse que chegou ao final da campanha – que trouxera mais uma derrota – com a mesma energia com a qual a começara. Em 2012, repetiu – praticamente de forma idêntica – a frase. Errou e repetiu no erro. O PSDB afunda.

O PSDB afunda, resistirá por mais tempo que se esperava provavelmente (ainda tem cartas a queimar e eventualmente dá sorte em ressuscitar um tipo como Artur Virgílio ou ACM Neto). Mas, certamente desaparecerá. A derrota em São Paulo agrava ainda mais a situação e o PSDB começa o projeto 2014 não disputando com Dilma Rousseff o Palácio do Planalto, mas com Eduardo Campos a preferência dos analistas como maior desafiante ao poder petista.

Se o PSDB está nesta situação, muito se deve a Serra: duas derrotas presidenciais não podem ser relativizadas. E se Serra errou, é porque não quis ser Jospin: colocou sempre sua fixação em entrar para história como presidente acima do interesse de seu partido, de “seu povo”, e não desistiu; sequer mudou e apenas seguiu irresponsavelmente em frente. Cego, não olhou para o lado e não percebeu que pode-se entrar na história por vários motivos, como fez Jospin, que renunciou ao sonho e abriu espaço para o novo. Serra sufocou o PSDB, ao não dar espaço para o novo. Serra sufocou a democracia, ao se alinhar com as ideias mais conservadoras e reacionárias deste país transferidas pelo discurso fundamentalista evangélico. Serra sufocou a análise crítica, ao não reconhecer sua responsabilidade pela derrota. Serra sufocou a si mesmo. E morreu. No discurso da morte acenou com um “até logo” (2010), quando todos gritavam: Serra, seja Lionel Jospin!

Eu gostaria de ver José Serra ter a coragem de Lionel Jospin.
Ódio a Serra? Não, simplesmente muito carinho pela nossa frágil democracia, que tanto terá uma oposição fracassada, tanto terá um governo irresponsável. Serra, seja Jospin!
Amor a Serra? Tampouco, se aviso é porque simplesmente penso que Serra ainda não tenha tomado conta que a hora de se retirar da política passou. Prezo pela integridade da política: Serra, seja Jospin!

Serra, seja Jospin! Dê Adeus!


Links discursos relacionados:


Pronunciamento Jospin 2002 – Abandono da vida política (em francês) http://www.youtube.com/watch?v=Ux11q2LX4Ms


Oscar Berg,
Brésil, le 28 Octobre 2012